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Fantástico mundo novo! – Volume II – Capítulo IX – Novos grupos são formados.

  1. Novos grupos são formados.

As intensas emoções vividas na viagem ao planeta Orient, especialmente o conhecimento do projeto grandioso de que tomariam parte, deixou o grupo silencioso e sonolento. Aliado ao efeito soporífero do perfume existente no interior do transportador, levou todos, menos Mink, Arki e seus ajudantes, a dormir na viagem de retorno. Quando o estranho objeto desceu dos céus, pousando na praia, a cidade inteira estava dormindo, exceto alguns noctívagos e vigilantes encarregados da segurança. Para eles a luz vista significou um evento como o de um meteoro, mais conhecido como estrela cadente.

Foi preciso acordar um a um no momento de desembarcar. Estavam como que anestesiados. Já do lado de fora, o grupo celestial parou sobre a plataforma, tendo Arki a frente, que falou:

– Agora vocês sabem qual é sua missão. Deverão escolher seus grupos de dez pessoas, preferencialmente cinco casais. Depois, sob orientação de Mink, começarão o processo de instrução. Procurem lembrar como ocorreu o caminho de vocês do começo até aqui. Não precisam fazer tudo igual, mas que sirva de inspiração. Os meus amigos e eu estaremos sempre a postos para ajudar no que for preciso. Nos veremos de tempos em tempos.

Os seis levantaram as mãos estendendo-as sobre o grupo e falaram ao mesmo tempo:

– Fiquem com a benção do Pai Universal.

Retornaram ao interior do transportador, enquanto a plataforma se fechava. O grupo se afastou enquanto o transportador acionava seus propulsores iniciando a ascensão. Subiu até uma centena de metros e iniciou a aceleração, rumo ao horizonte, onde sumiu em poucos segundos. Os integrantes do grupo se entreolharam, ainda incrédulos. Depois voltaram-se para Mink que estava ali, como que aguardando que alguém falasse algo. Como ninguém se manifestou, decidiu dizer:

– Agora vocês conhecem a natureza da missão que nos espera. Também sabem que temos um longo período de preparação pela frente, antes de partirmos para nosso destino. Ainda é tempo de desistir, se alguém não se sentir disposto a encarar a tarefa. Fiquem sabendo que não sofrerão nenhuma represália, apenas a experiência será apagada de suas mentes, para não haver quebra de sigilo. Vamos dormir, descansar bastante, pensar em tudo e nos veremos durante a semana. Antes de começarem a escolha de seus grupos, analisem profundamente tudo e decidam se querem fazer parte dessa missão. Vamos para nossas casas.

Iniciaram a caminhada e aos poucos começaram a trocar as primeiras impressões entre si. Ao chegarem próximos ao centro, começaram a separar-se, indo na direção das respectivas moradias. Mink chegou e ficou um longo tempo deitado, enquanto seus pensamentos iam do grupo ao planeta Oriente, novamente ao grupo, depois Edith entrava em foco diante de seus olhos. Mesmo na total escuridão da noite, ele a via nitidamente com os olhos da mente. Estava radiante, sua pele suave, seu rosto perfeito, emoldurado por uma profusão de cabelos ondulados e castanhos. Sentiu o coração acelerar e, não fosse o adiantado da hora, teria levantado para ir a sua procura. Colocou sua vida nas mãos do Pai Universal, disposto a fazer sua infinita e santa vontade.

Dormiu até o sol brilhar alto no céu, na manhã do dia de descanso. Muhn foi até seu leito e o acordou:

– O que está acontecendo com você hoje? O sol já está alto no céu e ainda dormindo! Vamos levantar, meu filho.

Ele abriu os olhos e viu os raios solares penetrando por vários pontos da casa. A mãe acabava de abrir a janela e lá de fora entrou o canto dos passarinhos. Lembrou imediatamente ter prometido a Edith levar os pais para almoçarem na casa da família de Abud e Leihla. Se ficasse mais tempo na cama, chegariam atrasados e isso não seria conveniente. Daria a impressão de ser preguiçoso, dorminhoco, o que absolutamente não era coisa sua. Espreguiçou-se e, tão logo Muhn saiu, levantou-se, vestindo as roupas. Não tinha o hábito de dormir nu, mas retirava as roupas mais pesadas, ficando apenas com o essencial para cobrir sua intimidade.

Foi até o quarto de banhos, onde se lavou cuidadosamente, antes de vestir a roupa que usaria para o almoço daquele dia. Cumprimentou Sock que passeava calmamente no jardim, apreciando a profusão de plantas e flores. Respondeu ao cumprimento do filho e continuou. Mink tomou uma caneca de chá com leite que a mãe lhe preparara. Comeu frutas secas, além de um pedaço de uma espécie de pão, feito de uma mistura de farinhas de cereais. Depois falou:

– A senhora não esqueceu do almoço na casa dos pais de Edith! Não precisa se preocupar com o almoço de hoje.

– Estou pensando que roupa vou vestir. Não quero fazer má figura diante dos pais de sua noiva.

– A senhora fica bem com qualquer roupa, mamãe. Nem se preocupe. Apesar de ricos eles são pessoas simples. Espere para ver.

– Seu já está pronto para sair. Ele não quer demonstrar, mas está nervoso com essa visita. Nunca entrou em casa de uma família realmente rica como eles.

– Mais um que está preocupado. Isso é desnecessário. Até parece que não sou eu o noivo.

– Você é nosso filho caçula. Estamos empenhados em dar todo apoio para que você faça um ótimo casamento.

– Isso eu concordo. Me parece que não poderia fazer melhor escolha.

Nesse momento o pai Sock voltou de seu passeio no jardim. Viu os dois conversando e parou ao lado, afirmando:

– Andei me informando e posso dizer que obtive as melhores referências da família.

– Quem foi que lhe deu informação, papai?

– Eu fui discreto. Não dei nenhum sinal sobre o objetivo que eu tinha. Pode ficar sossegado, filho.

– Eu vou me vestir. Vocês estão prontos e podem conversar enquanto faço isso.

Ficaram os dois na sala de visitas, enquanto a mãe ia trocar suas roupas e cuidar de seus adornos. Não demorou muito e ela estava pronta. Escolhera uma de suas melhores roupas, colocara um colar além de um anel e algumas pulseiras. Coisas que todas as mulheres apreciam. Foram o marido e também os filhos que a haviam presenteado em várias ocasiões com esses adornos. O filho e o marido a elogiaram pela elegância, apesar de estar avançada em anos. Conservava ainda boa parte do frescor da juventude e vitalidade.

Depois de verificar se tudo estava em ordem na casa, fecharam as portas, deixando-as trancadas, antes de saírem para a rua. O percurso de poucos minutos foi feito com calma. Ao chegarem ao portão do palacete, Muhn soltou um suspiro de admiração. Conhecia a moradia, mas nunca lhe dera a devida atenção. Nesse momento, antes de entrar, demorou-se a olhar atentamente para os detalhes.

Um criado os aguardava e franqueou a entrada, instando-os a seguir até a porta de entrada principal. Ali chegando, Abud e Leihla vieram ao seu encontro e Mink fez as apresentações:

– Senhor Abud e Senhora Leihla, estes são meus pais Sock Muhn.

– Sejam bem-vindos à nossa humilde residência, – falou Abud.

Trocaram apertos de mãos e abraços, como era costume entre as pessoas mais elegantes. Leihla e Muhn trocaram beijos nas duas faces. Depois foram conduzidos para o interior onde os convidaram a sentar em confortáveis poltronas. Logo que sentaram, Edith chegou e cumprimentou:

– Venho apresentar aos pais de Mink as boas vindas. Eu sou Edith de quem deve ter ouvido falar.

Levantaram-se e apertaram a mão da jovem, constatando tratar-se de alguém realmente encantador. Não fora sem motivo que o filho sentira tamanha atração por ela. Sentou-se ao lado de Muhn, pondo-se a conversar animadamente por um momento. Até mesmo Sock ficou prestando atenção ao que diziam. Ficara impressionado positivamente com a beleza e candura da jovem. As outras noras eram todas muito estimadas, mas tinham um tipo mais comum, sem deixarem de ser belas. Mas Edith superara a todas em atributos. A natureza se esmerara em lhe conceder o que de melhor encontrara. Abud chamou um criado e segredou-lhe uma ordem, que ele tratou de cumprir imediatamente.

Alguns minutos depois o criado voltou, acompanhado de uma criada, trazendo uma vasilha de cristal, contendo um líquido alaranjado, além de vários copos, também de cristal. Tudo foi colocado sobre um aparador que foi posto no centro. Os copos foram enchidos com o suco e oferecidos aos presentes. Era uma mistura de sucos de frutas, com um pouco de mel para acentuar a doura e realçar o sabor.

Todos beberam o líquido e elogiaram sua qualidade. Depois dos copos vazios, Edith se encarregou de tornar a colocar mais suco para quem queria. Em algum tempo a grande vasilha estava vazia. O mesmo criado materializou-se como por encanto e recolheu as vasilhas. A criada veio avisar que a refeição seria servida logo mais. Poderiam tomar seus lugares para comer. Foram conduzidos ao lavabo para fazer a ablução das mãos e depois seguiram para a sala de refeições, já conhecida de Mink. Estivera ali há algumas semanas. Saborearam um lauto banquete, com variedade de carnes assadas, além de frutas, saladas diversas, acompanhadas de ótimo vinho. Não poderia faltar um prato de peixe, da melhor qualidade encontrada.

No meio da refeição, os cálices foram recheados de vinho e um brinde foi proposto por Abud.

– A saúde de nossos filhos Mink e Edith, que pretendem dedicar suas vidas um ao outro.

Todos ergueram suas taças e depois beberam um generoso gole. Novamente sentados, continuaram a degustação dos pratos que estavam divinamente preparados. Depois de nova rodada de vinho, foi a vez de Sock erguer um brinde:

– Que os nossos filhos nos tragam netos em abundância e com saúde perfeita.

Novo gole e mais comida. Não tardou e os rostos começaram a apresentar sinais de uma leve embriaguez. O vinho era saboroso, mas encorpado e seu teor alcoólico era de bom nível. A ingestão abundante de comida contribuiu para minimizar os efeitos da bebida. Mesmo assim desabaram sobre as poltronas ao saírem da mesa. Para arrematar foi servido um pequeno cálice com licor feito a base de vinho, mel e extrato de anis. Era extremamente saboroso, porém forte, completando o que o vinho fizera durante a refeição.

Passou um intervalo de tempo e Leihla fez sinal à criada, que se aproximou para receber as ordens da dona da casa. Esta lhe ordenou trazer o chá para ajudar na dissipação dos vapores do álcool. Depois de sorver alguns goles da bebida quente, aos poucos a névoa do álcool começou a dissipar-se aos poucos. Mesmo assim demorou praticamente o resto da tarde para concluir sua tarefa. Ao entardecer, depois de passar algum tempo em palestra mais íntima com Edith, Mink e os pais se despediram, retornando para casa. Pouco antes de chegar em casa, Sock falou:

– Você fez uma excelente escolha, meu filho. Pelo que foi possível avaliar num primeiro encontro, a sua eleita é uma joia rara.

– Concordo com seu pai. Ela é uma obra-prima da natureza e um primor de educação. Simplesmente fiquei encantada com ela.

– Fico contente com isso, papai e mamãe. Espero que ela tenha a paciência que será necessária para suportar viver ao meu lado por longos anos.

– E por que motivo ela terá que ter tanta paciência?

– Não é fácil aguentar as impertinências de um homem pelo resto da vida. Só isso, minha mãe.

– Você, que é um jovem doce e amoroso, não será nenhum sacrifício viver ao seu lado.

– A senhora é minha mãe e é suspeita como testemunha.

– Sua mãe tem razão. Sempre ouço as pessoas fazerem elogios a você, especialmente os seus discípulos, os seus pais e todos que convivem com você.

– Não sabia que falavam tão bem de minha pessoa. Não penso ser tão bom e doce como dizem. Mas, não posso contradizer as pessoas. É a opinião delas e só posso ficar grato pela generosidade de suas opiniões.

Nisso chegaram em casa e encontraram Sumock e Song à sua espera, com as famílias. Voltavam de um passeio e decidiram fazer uma breve visita. Foram momentos de alegria. Os netos brincavam no jardim, enquanto o sol concluía seu trajeto pelo céu, chegando ao poente. Muhn chamou todos a entrar e propôs fazer um jantar leve. Os filhos recusaram, dizendo que iriam para suas casas. A mãe certamente estava cansada e não seria justo lhe sobrecarregar com o trabalho extra de preparar o jantar para tanta gente. Despediram-se dos pais e irmão, encaminhando-se para suas casas situadas algumas quadras dali.

Os três se limitaram a cear apenas alimentos leves. Frutas, leite, queijo e pão. Terminavam de fazer a digestão do almoço abundante. Mesmo o clima de alegria que dominava a todos, foram dormir cedo. O vinho agia tardiamente, levando-os a sentir sono antes da hora habitual. Os corpos estavam relaxados e dormiram sem demora. Na manhã seguinte Sock e Mink saíram para trabalhar, enquanto Muhn ficou para providenciar o almoço.

No decorrer da semana ocorreu o encontro dos membros do grupo com Mink, ocasionando sempre a troca de algumas frases sobre a missão, perguntas feitas para esclarecer dúvidas que surgiam com o passar dos dias. Havia gente hesitando em seguir como membro da missão. Mink fazia sua parte, estimulando sempre com palavras de ânimo. Era cauteloso no que dizia, pois a decisão seria tomada individualmente, sem pressão de espécie alguma.

Quando chegou ao final da semana, todos estavam decididos. Ninguém pretendia recuar, depois de conhecer o alcance do projeto. Seriam os pais da população futura de um planeta, onde ocorrera o desastre da extinção, por irracionalidade dos dirigentes. Seria necessário levar um grupo coeso e firme na fé, para formar a base da população, capaz de levar avante os planos ambiciosos dos dirigentes celestes. No encontro daquela noite, véspera do dia de descanso, Mink constatou que já haviam iniciado o processo de arregimentar os novos membros dos grupos.

Indagou deles como haviam procedido e eles narraram os detalhes. Foi obrigado a concordar com suas decisões, pois tratava-se de gente de valor e que interessava à missão. Aos demais fez recomendações que ele próprio seguira anos antes ao selecionar os dez. Em breve haveria mais cem pessoas recebendo instrução. Na qualidade de líder geral, precisaria transitar entre os dez grupos, esclarecendo e reforçando os ensinamentos. Estabeleceram como meta o período de quatro semanas para completar a integralização dos componentes dos grupos. Não havia uma exigência rígida, pois tudo dependia de um momento, uma reação que levava à certeza de estar diante de um elemento de interesse.

Ao final da quarta semana depois da viagem do grupo, Mink encontrou-se novamente com Arki, no alto do penhasco. Relatou-lhe o progresso que vinham fazendo. O anjo ouviu com atenção, aprovando tudo no final. As correções precisariam ser feitas no decorrer do tempo. É impossível prever as reações de cada um. Não existe nada melhor que o tempo para colocar cada coisa em seu devido lugar. Arki indagou de seu amigo:

– E como está indo seu relacionamento com a futura esposa?

Ele ficou surpreso com a pergunta. Logo, porém, se lembrou de estar diante de um anjo. Nada poderia ser ocultado. Por isso falou:

– Estamos caminhando bem. Nossas famílias já se conhecem, aprovam nossa união e comecei a dar a ela as primeiras instruções. Se ela vai viver comigo, precisará acreditar nas mesmas coisas, pelo menos no geral. Até agora falei pouca coisa, mas ela aceitou bem tudo que eu disse. Não quero causar impacto negativo, especialmente com a família dela. Eles vieram da Mesopotâmia e suas crenças são um pouco diferentes das locais.

– A grande mistura de religiosidades, provenientes de todas as partes, torna mais simples a introdução de novas ideias. Não é isso que acontece?

– É o que parece ao menos. Foi assim com os primeiros dez e acho que vai ser assim com os novos. Não tenho dúvida de que também não vai ser diferente com minha futura esposa.

– Nunca considere nada como totalmente certo. Podem aparecer problemas no meio do caminho. Os problemas aparecem para serem enfrentados e resolvidos. Basta ver que os humanos não deixaram de progredir, apesar da rebelião do Soberano Lúcifer, junto com seus seguidores como o Príncipe Planetário e muitos anjos. O erro de Adão e Eva, mesmo assim não deixou de trazer suas contribuições para a evolução geral.

– Confiar, ter fé, é a solução.

– Isso mesmo, amigo.

– Demorei, mas aprendi, depois de muita repetição sua. Agora me cabe fazer com os outros o que você fez comigo. Sei que não é fácil, mas vou conseguir, pode crer.

– Estaremos sempre prontos a prestar ajuda, quando precisar. Se esforce por atingir os objetivos sozinho, mas quando surgir algum problema especial, pode contar comigo e os instrutores. Eles aparecerão de tempos em tempos para reforçar a instrução aos novos membros.

– Eu havia esquecido de dizer. Eles conseguiram identificar o significado dos círculos. Demoraram um pouco, mas logo perceberam que havia alguma relação com o Pai Universal, com o Paraíso. Acompanhei suas discussões e houve um momento em que Kimiko atinou com a resposta. Depois que ela expôs a ideia, os demais também tiveram certeza de que os círculos um dentro do outro, representam a Trindade do Paraíso. Não foram bem essas palavras que usaram, mas a ideia foi essa.

– Significa que estão no bom caminho. A fé penetrou fundo em suas mentes. Estão se harmonizando com a fagulha, a partícula do pai.

– Achei que gostaria de saber disso, mesmo não tendo perguntado.

– Na verdade eu sabia, mas queria ouvir de você. Eles deram um passo importante na direção da vida evolutiva.

– Fico contente em saber que meu trabalho foi bem-feito. Só espero ser digno da misericórdia do Pai.

– Até aqui seu trabalho foi ótimo e esperamos que continue a ser cada vez melhor.

– Andei perto de perguntar por que falou “esperamos”. Mas lembrei que você é apenas o mensageiro do governo do sistema. Por isso fala no plural e não no singular.

– Todos somos incumbidos de tarefas. Estamos a serviço em toda parte. Quando terminamos uma tarefa num lugar, somos enviados para outro, onde nova tarefa nos espera.

– Penso que um dia seremos todos servidores do pai, em algum ponto de sua imensa criação. Quando chegarmos ao Paraíso, haverá algum tempo para gozar a vitória e novamente partiremos em busca de novas tarefas.

– Isso eu não falei para você, mas foi o seu ajustador que fez você compreender essas coisas. Seu destino futuro é glorioso.

– Só quero servir ao pai e ser digno de sua misericórdia.

– A humildade é uma grande virtude.

Nesse momento Arki deu um passo para trás e acenou para Mink. Este acenou em despedida e imediatamente o transportador zumbiu, partindo em sua viagem de volta. O jovem líder Mink ficou sozinho e em seguida voltou a sua casa. No caminho passou diante do palacete em que morava Edith e dirigiu seus pensamentos para a amada. No dia de descanso e decorrer da semana o grupo dos dez completou a seleção dos novos membros. Numa reunião do grupo na noite anterior ao próximo dia de descanso, todos apresentaram a lista de seus escolhidos. Passaram um longo tempo narrando tudo que se relacionava às suas escolhas. Ao final da reunião foram orientados no sentido de irem devagar com as instruções nos momentos iniciais. Uma precipitação poderia espantar os novatos.

Também não deveriam hesitar em pedir orientação em caso de dúvidas. Foi sugerida a criação de uma especie de sociedade, da qual participariam somente os membros da missão. Haveria eventos de congraçamento entre todos e troca de ideias, informações, experiências. Essa troca permitiria enriquecer o processo como um todo, além de aproximar os integrantes entre si. Quanto mais amizade fosse cultivada, melhores resultados seriam colhidos no futuro. Não poderiam juntar alguns milhares de pessoas, que mal se conheciam, apenas tinham a mesma fé, dispostos a cumprir uma missão, sem que uma forma de convivência ocorresse previamente. Mink achou a proposta boa e sugeriu que os dez se encarregassem de amadurecer a ideia.

Houve concordância quanto a isso. Sempre consultariam Mink sobre cada passo dado no sentido da consecução do projeto. Desse modo surgiu algo como um clube, com a mesma fé e comungando os mesmos ideais. Os fundadores eram Mink e o grupo dos dez primeiros. O símbolo do clube eram os três círculos azuis sobre um fundo branco. Aos poucos os integrantes dos novos grupos foram levados a fazer parte e isso permitiu que a integração se tornasse mais intensa. Grupos de discussão eram formados com membros de diferentes grupos, que posteriormente apresentavam ao grande grupo as conclusões que haviam alcançado. Ouviam questionamentos, sugestões e, por fim, se fazia uma avaliação do trabalho.

Ao informar Arki desse sistema, o anjo aprovou. Tudo havia sido informado à administração do planeta e também do sistema. A ordem recebida fora não interferir nos rumos que os grupos estavam tomando por sua iniciativa. Aprenderiam desde cedo a viverem em comunidade, dividir responsabilidades e tomar decisões em conjunto. Estes atributos eram extremamente importantes para o êxito da missão. Quanto mais independentes eles se tornassem, desde que não ocorressem desvios na fé e convicção, maior seria chance de sucesso. Os instrutores, seres intermediários permanentes da Terra, que já haviam estado com o grupo dos primeiros dez, se revezavam fazendo visitas periódicas. Nessas ocasiões todos os grupos eram reunidos para ouvir suas palavras. Eram tidos como sábios, vindos de lugares remotos pelos novos integrantes.

Os meses passaram, os grupos novos avançavam em seu aprendizado. Ocupado em coordenar as atividades extraordinárias, além de ministrar suas lições de leitura e escrita, Mink se deu conta de que a época estabelecida para as bodas com a eleita de seu coração estava próxima. Precisou acelerar os preparativos para que tudo ficasse pronto a tempo e não fosse necessário adiar a data. As despesas mais pesadas da festa ficaram a cargo dos pais da noiva, que fazia questão de comemorar a data com toda pompa. Já nessa época a China era conhecida pela sua técnica de produzir tecidos com fios de seda. Foi de lá que vieram os tecidos para vestir a noiva no dia das bodas, bem como confeccionar o enxoval que ela usaria nos primeiros tempos de vida conjugal.

Com uma contribuição de Mink, reunindo suas economias coletadas ao longo dos anos, uma cota doada por Sock e outra parcela generosa do Senhor Abud, foi adquirida uma bela vivenda para o casal. Em Kibong não se adotava o costume de manter os filhos casados vivendo com as esposas sob o mesmo teto dos pais. Não se queria com isso estabelecer uma separação das famílias, apenas dar aos jovens esposos a liberdade necessária para os ajustes necessários no início da vida conjugal. Os dez membros iniciais do grupo de pioneiros foram convidados para a festa. Alguns dos novos membros, eram filhos de famílias amigas e assim também fizeram parte do grupo de convidados. A ampla residência da família da noiva, dispunha de espaço suficiente em um salão na parte lateral para abrigar os convidados em geral. Os mais íntimos teriam acesso à área mais nobre da moradia.

O dia chegou e Mink estava nervoso. Muhn tentou acalmá-lo, porém não teve êxito, uma vez que ela própria estava com os nervos à flor da pele. O açodamento em se vestir, conferir os últimos detalhes, supervisionar o pai para que estivesse adequadamente vestido para a ocasião, tudo ajudava para tirar a tranquilidade do jovem. Foi preciso que Song e Xing, prevendo essa situação, chegassem e tomassem as rédeas. Em pouco tempo o ambiente serenou e os habitantes da casa ficaram mais calmos. Alguém estava no controle. Na hora correta saíram em direção ao ponto de encontro entre os noivos. Sun, um dos instrutores estava presente e assumiu a tarefa de proferir as palavras de praxe para a ocasião.

Os convidados perceberam claramente que ele era também ligado ao grupo de Mink, por usar na vestimenta o símbolo dos círculos, adotado pelo clube para adornar a porta de sua sede. Houve quem perguntasse o significado do símbolo, mas o fato logo caiu no esquecimento. Havia muita coisa acontecendo na cidade e as pessoas tinham mais com que ocupar seu tempo do que indagar o significado daquele estranho símbolo. Deveria ser mais um daqueles símbolos de uma corrente de pensamento. Elas surgiam de tempos em tempos, cresciam e depois eram substituídas por outras mais avançadas ou contrárias. Tudo dependia dos argumentos em que se baseavam.

A festa foi suntuosa. Os convidados se fartaram de variados pratos de todos os tipos. Vinhos de diversas origens, licores, sucos e refrescos havia em profusão. Os noivos receberam os convidados à entrada e depois eles eram encaminhados para os lugares em que seriam servidos os alimentos, bem como as bebidas. Quando o anoitecer se aproximava, os noivos, como era de hábito na cidade, se retiraram, sendo ladeados por uma longa fileira de convidados. Uma pequena carruagem, ricamente enfeitada, os conduziu até a entrada de sua residência. Ali havia apenas um casal de criados para ajudá-los a se instalar e depois se retirariam. A primeira noite que passariam na intimidade não deveria sofrer interferências alheias.

Os jovens homens habitualmente chegava ao casamento trazendo uma considerável experiência com atividade sexual. Em praticamente todas as cidades havia casas em que mulheres vendiam o corpo em troca de dinheiro. Os homens em geral, mesmo alguns casados, pagavam para ter alguns momentos de prazer sexual com essas mulheres. Eram denominadas com diferentes nomes, dependendo da região ou país. Prostitutas, rameiras, mulheres de vida fácil eram algumas dessas denominações. Mink não tinha nenhuma experiência. Desde criança estava envolvido com atividades num nível acima do que seria normal. Isso não lhe deixara tempo para dedicar a essas atividades, consideradas normais para um jovem adolescente. Chegou a ser considerado como afeminado, mas ele não se importou com isso. Sabia o que sentia, apenas via a vida sexual como parte do relacionamento entre homens e mulheres, não como algo inadiável.

Ao ficarem sozinhos eles se olharam profundamente nos olhos. Ele pegou Edith nos braços e a levou até a alcova em que consumariam sua união. Nesse momento ele lhe falou:

– Não espere de mim um desempenho de homem experiente em nossa primeira noite. Nunca deitei com uma mulher, como habitualmente acontece com os rapazes na adolescência e depois antes do casamento.

– Fico honrada em pertencer de corpo e alma a um homem que se deitou comigo em sua primeira noite de amor. Aprenderemos juntos os segredos.

– Me alegra sua compreensão. Não esperava outra atitude de sua parte.

– Me ajude a retirar essas roupas todas. Estou me sentindo como uma mesa enfeitada para um banquete.

– Basta dizer-me o que devo fazer.

Ela o orientou e logo se livrou das roupas, ficando apenas com a parte mais íntima. A beleza de seu corpo jovem ficou à mostra, deixando Mink embevecido. Ela se recostou nas almofadas da cama e o intimou:

– Vai ficar ai me olhando, ou vem tomar posse do que te pertence há tempo?

Começou a retirar também ele as roupas usadas no casamento, ficando em trajes íntimos. Depois aproximou-se da cama e, antes de mais nada, ajoelhou-se, tomou as mãos da esposa nas mãos, beijou uma depois a outra. Lentamente percorreu com beijos sucessivos os dois braços, até chegar ao rosto. Um perfume delicado impregnava os tecidos e a pele da jovem mulher. Sem pressa ele a beijou, primeiro com delicadeza e depois com sofreguidão, como se a longa privação da intimidade feminina precisasse ser compensada. O amor ocorreu com intensidade, sendo repetido até os corpos estarem exaustos. Adormeceram depois de apagar as velas que iluminavam o ambiente. O sol matutino os surpreendeu ainda na cama.

Mink levantou e observou a esposa, cuja nudez ficava parcialmente à mostra sob os cobertores leves, devido ao calor ambiente. Elevou o pensamento ao encontro do Criador e lhe agradeceu pela dádiva de uma companheira tão bela e carinhosa. Era, sem dúvida, um homem abençoado. Acabara de colher no jardim da existência uma das mais belas e perfumadas flores. Estava pronto a dedicar a ela todos os minutos de sua vida, unidos na mesma fé e disposição de fazerem a vontade de Deus. Ela já estava bem adiantada no processo de conhecimento da revelação que Arki lhe fizera. Aceitara de bom grado a crença num Deus de amor e misericórdia, em substituição a uma plêiade de deuses, cheios de rancores, ciumes e acessos de mau humor.

Seus familiares não se opuseram à mudança por não serem especialmente dedicados a uma ou outra crença. Tinham a noção geral e ampla dos sentimentos de honra, honestidade e justiça. Pautavam suas vidas por esses parâmetros. Isso facilitara as coisas, inclusive o fato de um membro do clube presidir a cerimônia de casamento. Ruth, a irmã de Edith, gradativamente estava sendo trazida pela irmão para o grupo.

A decisão de casar-se, iniciando a formação de sua família por parte de Mink, estimulara dois casais no grupo dos dez a fazerem o mesmo. O longo período de convivência, estreitara ao laços iniciais de amizade, ao ponto de surgir entre eles um sentimento bem mais profundo, o amor. Estavam preparando os respectivos enlaces. Daí resultariam alguns filhos, também integrantes do contingente final. Não seria possível uma previsão do número de pessoas a serem transportados no final do período preparatório.

Outra questão era o sigilo. Era ilusão imaginar que um grupo da magnitude esperada, pudesse manter em sigilo total as atividades que desenvolviam. As revelações alcançariam um grande número de pessoas e elas teriam a liberdade de escolher entre partir com o grupo, ou permanecer aqui. Também havia a grande possibilidade de que muitos dos selecionados viessem a desistir do projeto, deixando assim a questão quantitativa do contingente em suspenso. Só mesmo nos dias que antecederiam a partida seria possível determinar com mais precisão o número deles. Havia tempo suficiente para essas questões.

No primeiro encontro de Mink com Arki, após seu casamento, foi preciso indagar se a esposa Edith poderia estar presente em próximos encontros. Ela manifestara o desejo de conhecer o ser celestial e assim ouvir diretamente suas palavras. Se sua vida estava diretamente ligada ao marido, nada mais justo que participar dessas atividades, mais ou menos secretas dele. Ao ouvir a indagação, Arki prontamente respondeu.

– Ela pode vir, sim. Vocês serão o casal modelo da nova população de Orient. Nada mais correto do que ter na liderança um casal exemplar. Embora não sejam Filhos Materiais, como Adão e Eva, farão parte do um núcleo forte para de sustentação da fé e a verdadeira religião.

– Eu agradeço ao Pai diariamente pela graça de colocar na minha vida uma mulher como Edith. Ela é tudo que eu poderia esperar de uma companheira.

– Agradecer e adorar é parte da vida dos seres evolucionários. Você está no caminho certo. Adorar não requer rituais, fórmulas prontas para serem recitadas, oferendas, nada disso é de agrado do Pai. O que ele quer, é a confirmação de sua fé, com a submissão de sua vontade à dEle. É possível adorar o Pai a qualquer momento e lugar em que você estiver.

– O que significa que não é essencial haver templos, construídos com requintes de luxo e beleza, para podermos adorar o Pai.

– Os templos podem servir como locais de reunião, onde se pode ouvir novos conceitos, aprender novas ideias sobre o caminho da evolução. Os sacerdotes são perfeitamente dispensáveis. Geralmente servem apenas para onerar os adoradores com contribuições, destinadas a supostas oferendas e sacrifícios. Os templos devem ser lembrados por último, quando os demais requisitos estiverem realizados.

– Sempre ouvi dizer que era necessário construir templos para adorar os deuses. Para piorar, cada deus tem suas próprias exigências, tornando as coisas difíceis para o povo. Se determinadas exigências não forem satisfeitas, eles enviam castigos na forma de vários tipos de acontecimentos, como tempestades, raios, trovoadas, pragas agrícolas, secas ou chuvas em excesso. O povo fica perdido no meio de tanta exigência a cumprir.

– Isso tudo não passa de artifícios para manter o povo submisso aos desejos dos sacerdotes e seus chefes superiores. O Pai Universal não exige nada disso. Fazer a vontade dele, de maneira geral, é bastante simples.

– O principal segredo é a confiança em sua misericórdia, a fé em seu amor infinito.

– Não é bem simples?

– Muito simples mesmo amigo. Falando em casamento, tem dois casais do grupo que marcaram a data do casamento. Vamos ter famílias formadas dentro do grupo. Não sei se isso é bom, mas não tive como interferir.

– Nem deve tentar interferir. Respeite o livre arbítrio de todos. É um direito concedido pelo próprio Pai e nem ele o desrespeita. Seria muito simples para ele, em sua onipotência, fazer todos os seres caminhar na mesma senda rumo ao Paraíso. Mas isso não é o desejo de Deus. Justamente a liberdade de escolha determina a característica volitiva das criaturas mortais.

– E é esse o objetivo do Pai ao nos colocar nesses planetas para percorrer o longo caminho até o Paraíso. Ele precisa de nós para adquirir a experiência da evolução.

– Pelo menos é o que nós deduzimos de tudo que conseguimos saber, dentro das nossas limitações. Estamos constantemente aprendendo com vocês e as demais criaturas da evolução. A criação toda é um sistema dinâmico, uma gigantesca manufatura de astros, mundos e criaturas. Nada está imóvel, exceto a Ilha do Paraíso, residência da Trindade.

– Não há nada parado. Tudo está em movimento constante?

– Se algum dia parar, acaba tudo. O movimento faz parte da criação, como as ondas fazem parte do oceano. Nada existe sem movimento.

– Acho que entendo. Se ficamos em movimento, caminhando, ou fazendo alguma atividade, dificilmente iremos dormir. Ao deitar e ficar quieto, estando cansado, dormimos logo.

– De fato, tem algo a ver. Mas é bem mais complexo. Não vou tentar explicar, pois também não sei exatamente por que isso acontece.

– O povo perguntou o que significam os círculos que usamos como símbolo de nossa associação e dissemos que era uma nova corrente de pensamento. O que não deixa de ser verdade.

– Pelo menos não pode ser qualificado como uma mentira. Já o significado é muito maior do que apenas pensamentos.

– Alguns ainda perguntaram uma ou outra coisa, mas logo perderam o interesse. Grande parte da população está interessada apenas nos aspectos materiais. Não se importam de gastar dinheiro e tempo fazendo oferendas e sacrifícios aos deuses, contanto que consigam realizar seus objetivos apenas materiais. Esquecem que, trabalhando com afinco, alcançariam o resultado mais facilmente.

– É nesse ponto que a humanidade sempre se desvia dos ensinamentos repassados nas revelações que são feitas. Por um tempo a fé e confiança são mantidos firmes. Depois começam os desvios. Primeiro são pequenas coisas, aparentemente insignificantes, mas com o tempo se tornam problemas sérios. Verdadeiros fardos nos ombros do povo. Os sacerdotes e seus ajudantes se encarregam de aumentar esses fardos cada vez mais. Quando ocorrem desvios muito grandes, torna-se necessário que venha algum ser outorgado, trazendo uma nova etapa de revelação. Ao término da passagem desses reveladores, um grande número de homens abraçou a fé verdadeira e a conserva.

– Não há como evitar esses desvios?

– Lembre, o livre arbítrio precisa ser respeitado. Para induzir os homens a conservar a verdadeira fé, mesmo cometendo erros, seria necessário descumprir essa lei do Pai.

– Isso é bem complicado. Se ele mesmo concedeu esse direito ao homem, não pode agora passar por cima de sua própria vontade. Tornou-se vítima dos próprios atos.

– Mas ele tem em vista um objetivo muito superior. Por esse objetivo vale correr qualquer risco. Sua misericórdia se encarrega de dar aos desviados do verdadeiro caminho, uma nova chance. Isso é típico de seu infinito amor pelas criaturas. Esse é o motivo da necessidade de levar para o mundo moroncial a experiência de ser pai ou mãe. Só assim é possível compreender o profundo amor do pai pelos filhos.

– Novamente somos imagens de Deus. Ele ao olhar para nós, é como se visse a própria imagem, refletida na superfície de água de uma vasilha.

– É isso mesmo que acontece. Vocês humanos são imagens de Deus, o Criador.

– Se somos imagens de Deus e carregamos na mente um fragmento dEle, ficamos realmente parecidos com ele. Assim é possível começar a entender um pouco de tudo isso.

– Eu preciso voltar, pois o chefe me espera e tenho mais missões a desempenhar na sequência.

Um passo para trás e um aceno. O zumbido tão conhecido de Mink se fez ouvir e o raio azul riscou o céu. Viu-se sozinho de um momento para outro. Desceu e foi ao encontro de Edith, que o esperava ansiosa. Não perdeu tempo e lhe anunciou imediatamente que ela iria com ele nos próximos encontros com o anjo.

A notícia a deixou contente. Participaria plenamente da vida do seu amado. Abraçados foram para a alcova, onde se amaram intensamente.

Décio Adams

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