O touro da prefeitura.
Ocorreu nos primórdios da inseminação artificial, primeiro usada em animais de grande porte. Num programa de melhoramento genético implantado por órgãos públicos, a prefeitura de um município gaúcho da região noroeste, próximo à divisa com Argentina, criou seu programa de inseminação artificial. O objetivo era melhorar o plantel de vacas produtoras de leite, introduzindo material genético de linhagens com maior potencial produtivo.
Na secretaria de agricultura havia um departamento encarregado do serviço. Ali existia um equipamento de conservação do sêmen, importado de animais de alto padrão. Um funcionário treinado era encarregado de fazer o serviço. Por tratar-se de uma novidade, não tardou e alguns mais chegados ao lado humorístico da vida, passaram a se referir a este funcionário como Touro da Prefeitura. Sempre que um agricultor cadastrado se deparava com uma vaca no cio, avisava ao referido departamento que providenciava o deslocamento do mesmo até a propriedade do agricultor, levando consigo o material necessário. Por vezes era obrigado a passar o dia inteiro na estrada para atender a todas as solicitações.
Feito o procedimento, recolhia o material e fazia as recomendações pertinentes aos cuidados para confirmar a prenhez da vaca. Se ocorresse a falha, ela voltaria a entrar no cio, devendo ser repetido o procedimento. O custo do sêmen era pago pelo agricultor, o que levava alguns a não utilizar o serviço, por julgarem alto o custo e o resultado improvável. Se nascesse um bezerro macho, o objetivo não era alcançado, pois o desejável era que nascesse uma fêmea. Alguns sabiam como era feito o procedimento e ajudavam o funcionário em seu serviço. Havia a necessidade prévia de manter o animal preso na estrebaria, manter o local o mais limpo possível para facilitar a vida do “Touro da Prefeitura”.
O povo em geral estava dividido. Grande parte estava esperando o surgimento dos primeiros resultados, para então aderir ao uso da novidade. Enquanto isso fazia-se palestras nas localidades, procurando incentivar os agricultores ainda pouco familiarizados com os novos métodos. Haviam passado a vida vendo as vacas serem cobertas pelo touro e de repente o animal, antes tão importante, perdia seu lugar. Mesmo assim, gradativamente o programa ganhava adeptos. Os menos interessados eram aqueles que não tinham como objetivo vender leite. Criavam suas vacas e as ordenhavam para terem o leite para consumo da família, produzir um pouco de nata e manteiga, alguma ricota se houvesse sobra. Como sempre, implantar algo novo, demora e leva anos para apresentar seus primeiros resultados.
Em um ponto bem distante da prefeitura moravam o Fritz Schröder, casado com a Margarida. Tinham um casal de filhos e estavam iniciando com a produção de leite. Tinham todo interesse em conseguir produzir mais, com menos animais para cuidar. Isso significaria aumentar os ganhos, com apenas pequenos acréscimos de investimento. Fritz se inscreveu na prefeitura e esperavam ansiosamente pelo dia em que poderiam chamar o “Touro da Prefeitura” para inseminar a primeira vaca.
O dia esperado chegou finalmente, bem quando Fritz tinha que viajar para Santa Rosa para assinar o contrato de empréstimo junto ao Banco do Brasil. Tinham urgência na obtenção do dinheiro para investir na propriedade. No caminho passou pela prefeitura e avisou da necessidade do serviço, antes de tomar o ônibus para viajar. Margarida ficou esperando pelo funcionário, deixou a vaca presa na estrebaria e aprontou tudo. Pelo menos era o que ela pensava, pois não sabia bem como é que tudo funcionava. Em um lugar num canto da parede, fincou dois pregos um pouco separados, podendo ser usados para pendurar alguma coisa.
O funcionário chegou, se apresentou e Margarida o recebeu um pouco ressabiada. Tudo era novidade e ela, embora curiosa sobre a coisa, não tinha nenhuma intenção de assistir. O pudor herdado da sua educação, não permitiria que visse algo assim. Ajudou a levar os apetrechos necessários para a estrebaria onde a vaca se encontrava. Lá chegando, ela lhe apontou os pregos na parede, um balde com água, uma bacia, sabão e uma toalha, dizendo:
– Ali tem dois pregos onde você pode pendurar suas roupas. Depois pode lavar-se na bacia. Tem água no balde, sabão e a toalha para se enxugar. Agora me dê licença que eu não vou assistir a uma pouca vergonha dessas.
Deu meia volta e saiu rapidamente. O funcionário ficou estupefato. Não entendera as palavras da mulher. Infelizmente teria que se virar sozinho para realizar o procedimento, pois não adiantaria pedir o auxílio de Margarida. Ela provavelmente não seria de grande utilidade. Como para bom entendedor meia palavra basta, cada um pode imaginar o que Margarida pensava sobre a maneira que era feita a inseminação (kkkkkkkkk).
Curitiba, 18 de julho de 2015.
Decio Adams, IWA
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