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Eleições.

Voto obrigatório ou facultativo?
         Há décadas ouço falar nesse assunto e sempre ficamos na mesma. Os políticos em geral sequer aceitam discutir a questão. Alguns até aceitam discutir, mas logo apresentam uma porção de justificativas para manter o “status quo”.

                              


         Fiz meu primeiro alistamento eleitoral em Foz do Iguaçu, depois de ter prestado o serviço militar em Santo Ângelo, no estado do Rio Grande do Sul, durante 1967/68. Podem não acreditar, mas eu tenho guardado o meu primeiro título de eleitor, emitido em 12/03/1970, na 46ª Zona Eleitoral, e votava na 92ª seção. Quem o assinou foi o Juiz Evaldo Seeling. Muito cedo fui convocado para exercer as funções de mesário, tendo sempre comparecido, mesmo com sacrifício, pois não existia nenhuma preocupação com o bem estar desse enorme contingente de trabalhadores que prestavam um serviço ao país. Nunca me ocorreu reclamar. Aprendera a ficar quieto por orientação de pais e professores, pois vivíamos os primeiros anos do Regime Militar. Não tinha a menor intenção de arranjar confusão. O que eu queria era trabalhar para ganhar o sustento e estudar, visando meu futuro. Pode parecer estranho eu ter guardado esse documento, que, como pode ser visto na imagem, está bem danificado pelo uso, uma vez que não tinha qualquer proteção e o papel não era lá dos melhores convenhamos. As inúmeras vezes em que foi dobrado e desdobrado, fizeram com que se rasgasse e eu o colei com fita adesiva, que está ali até hoje. A cor atual é resultante do manuseio frequente e da ação do tempo. Creio que ele diz algo da minha história como cidadão e por isso não vejo razão alguma em descartá-lo. Permanecerá até o dia em que alguém, depois que eu partir, decida jogá-lo fora, ou talvez preservar como alguma coisa histórica. 
        Perdi a conta do número de vezes que cumpri meu dever de votar. Algumas vezes justifiquei por estar ausente do domicílio eleitoral e em outras até paguei a multa por não ter tido possibilidade de votar e nem justificar. Nunca me pareceu demasiado oneroso ir lá, esperar um pouco e depositar meu voto na urna, coisa que hoje ficou bem mais simples com o advento da urna eletrônica. Depois de publicar o primeiro artigo falando de eleições e política, ocorreu-me fazer algumas reflexões sobre o assunto “voto obrigatório ou voto facultativo”. Tive ocasião de ouvir pessoas discorrendo em altos brados e voz vibrante, sobre a injustiça da obrigatoriedade do voto. Vou fazer minha análise em duas etapas. Começarei por analisar o voto obrigatório.
Porque o voto não deve ser obrigatório?
        Creio que a maior parte dos favoráveis a essa opção, é movida principalmente por dois motivos.
Primeiro:as sanções impostas ao cidadão que não comparece às urnas é o pagamento de uma multa. O valor dessa multa não é o importante, mas o tempo que se é obrigado a dispender para ir até o cartório eleitoral, pegar a guia, recolher e depois retornar para apresentar a quitação. Não sei se existe algum outro procedimento a ser preenchido. Enquanto não é regularizada a situação, há algumas privações de direitos como obter passaporte, participar de licitações públicas, prestar concurso público. Essas são as que me ocorrem no momento. Não lembro se esqueci de alguma coisa. 
Segundo: O segundo motivo é, a meu ver, bastante egoísta e desprovido de espírito cívico, pois o que muitos querem é viajar, passear nos dias em que se realizam as eleições, deixando que os outros decidam quem vai governar o país; quem vai discutir e aprovar as leis. Ocorreu-me nesse momento mais um motivo. Se depois os governantes eleitos não estiverem em conformidade com os anseios da população, eles que não votaram, se eximem de responsabilidade. “Foram vocês que os elegeram. Ainda bem que não votei nesses caras.” Isso é na verdade uma forma pouco coerente de encarar a questão.
Direito implica dever.

        Desde a mais tenra idade aprendi que, para fa
zer jus aos direitos, é necessário cumprir os deveres que eles trazem consigo. Não podemos querer apenas gozar de nossos direitos, sem fazermos nossa parte. Por isso creio que, contra a opinião de uma grande maioria do povo, creio que o voto obrigatório tem um motivo para existir. Não vou aqui afirmar que ele tem que ser obrigatório. Imaginaram como seria edificante se, no dia da eleição, todos levantassem de sua cava, vestissem uma roupa adequada e se dirigissem alegremente aos locais de votação? Livres, por sua própria e espontânea vontade para cumprir o dever cívico para com sua comunidade, sua nação! Uma multidão de cidadãos decidindo o futuro de seu país, seu estado e município. Pena que isso é mera utopia. Temos a inclinação natural de fazer apenas o que gostamos e, para muitos, votar simplesmente não faz parte do cardápio. Há outras coisas que somos obrigados a fazer, mesmo não gostando e nos submetemos pois disso depende a obtenção de alguma vantagem. Porque votar não pode ser mais um dos atos que aceitamos, mesmo não gostando? Porque nos rebelamos contra nossos pais quando querem nos induzir a seguir determinada carreira profissional por essa ou aquela razão? Nem que seja apenas para contrariar, seguimos um rumo diferente, não raro acontecer de nos arrependermos depois e até mesmo voltar atrás. Mas eleger os nossos governantes queremos que os outros façam por nós, enquanto ficamos assistindo e depois aplaudindo, dizendo: Não fizeram mais que a obrigação! Ou então: Quem mandou votar nessa gente? 
         Para vivermos em uma democracia precisamos nos comprometer com ela, empenhar nossas forças na consecução dos ideais democráticos, mesmo contra uma porção de entraves, desvios de conduta e obstáculos encontrados. Há quem defenda, como forma de protesto, uma campanha pelo voto nulo, abstenção ou voto em branco. Nenhuma dessas ações traz qualquer benefício. Ao contrário, aumenta a vantagem dos politiqueiros, pois eles e seus correligionários certamente farão questão de votar certinho, sem faltar um único. Por isso se elegem, pleito após pleito, tornando-se vitalícios nos cargos ocupados. Há alguns deles de que tenho lembrança desde minha juventude e ainda hoje estão lá, esfregando os fundilhos nas cadeiras do parlamento, dos gabinetes e arredores. Se queremos mudar os rumos políticos de nosso país, devemos votar sim, de modo consciente, baseado em uma análise criteriosa das qualidades e propostas dos candidatos. Enquanto não houver a conscientização da necessidade do voto como forma de participar da vida da nação, o voto, infelizmente, deve ser obrigatório. Oxalá um dia possamos proclamar que o voto é livre e termos um índice de abstenção bem baixo. Esse será o dia em que podermos dizer que estamos vivendo em uma democracia de verdade.

Porque o voto deve ser facultativo?

         Muitos que hoje vão às urnas por força de circunstâncias, como por exemplo funcionários públicos, se não votarem ou justificarem não receberão seus salários. Quem não votar não pode prestar concurso público e nem assumir função pública para a qual tenha sido concursado, quer antes ou depois. Não tem o direito de participar de licitações públicas. Não consegue obter passaporte quem não vota e assim por diante. Ao ser tornado facultativo, uma grande multidão dos que hoje vão votar por obrigação, deixará de fazê-lo. Com menos eleitores votando, menor será o número de votos necessários para eleger um candidato, o que favorece especialmente os que usam de meios escusos para obter votos. Sabemos que eles existem, por mais que haja proibições, sanções severas e toda sorte de medidas preventivas, ainda assim há quem compre voto; outros são coagidos a votar em determinado candidato com os mais variados artifícios. Um vasto arsenal de recursos utilizados por quem de outra forma não chegaria aos cargos públicos ou neles conseguiria se manter. A pergunta que eu faço: É isso que queremos? Já não temos em quantidade suficiente ocupantes de cadeiras eletivas, indignos de ocupa-las, mas por força dos votos obtidos não os conseguimos remover de lá? É nosso desejo alijar para sempre candidatos de qualidade, que por falta dos nossos votos não conseguem ter a chance de serem eleitos?

       Quando apregoamos liberdade para tudo e para todos, esquecemos via de regra uma coisa básica. Sou livre, nasci livre, cresci livre e vou morrer livre. Porém ao exercer minha liberdade não devo jamais esquecer que meu vizinho, colega, amigo, irmão, enfim todos os outros cidadãos gozam da mesma prerrogativa. Não me é permitido invadir, lesar, suprimir a liberdade de nenhum dos meus semelhantes. Ouvi inúmeras vezes dizer que nossa liberdade termina onde começa a o outro. Essa é a questão que quase sempre esquecemos, queremos exercer nossa liberdade às custas de privar aos outros desse mesmo direito. Conseguem imaginar um país onde ninguém quisesse votar? De onde viriam os governantes, os legisladores? Pensam que eles deixariam de existir? Ao contrário, surgiriam rapidamente, disputando à força os cargos, as posições. É muito simples deduzir qual seria a consequência. Retrocederíamos aos tempos da barbárie, valendo a lei do mais forte, de quem pode mais, quem tem domínio sobre um maior número de indivíduos mantidos à custa de muito suor e lágrimas do povo.

     A nossa liberdade está ligada intrinsecamente às nossas obrigações, deveres e responsabilidades. Quando compreendermos isso na sua totalidade, seremos capazes de construir um mundo mais feliz, justo e fraterno. Pode ser utopia, porém, muita coisa que um dia foi chamada de utopia, hoje é feliz realidade. Isso me anima a batalhar, mesmo que seja contra uma imensa maioria. Resta-me a satisfação de ter feito a minha parte. Você está fazendo a sua? Se está, seja bem vindo aos batalhadores. Vamos unir forças e conquistar outros, por ora
indecisos ou acomodados para se engajar e também fazerem a sua parte.


                                                      Décio Adams                           Curitiba, 25 de agosto de 2014.

PS.: Esse texto, foi publicado no dia 21 de julho em um blog do meu amigo Jorge Purgly. Ontem li um artigo sobre o assunto e achei oportuna a republicação, depois de fazer algumas pequenas alterações. Quem já o leu, por favor releve e passe adiante. 



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