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Gaúcho de São Borja! – Capítulo X

Chegando a São Borja

 

Trevo de acesso à São Borja.

 

Reivindicação de melhorias no serviço de segurança.

 

Prestando contas da viagem.
 
 
Antes de seguirem para a fazenda, passaram na casa da cidade. Joaquim queria ter uma conversa reservada com Gaudêncio e passar no Banco do Brasil para resolver a questão de um financiamento. A mulher do caseiro também era a cozinheira eventual. Tinha pedido que um almoço para os dois fosse preparado. Gaudêncio, apesar de ter feito uma refeição leve em Porto Alegre, não recusou fazer uma “boquinha” da comida que foi servida. Enquanto comiam, narrou suas andanças na capital, especialemente no que se referia ao encontro com os agentes de investimentos. Joaquim aprovou as decisões e medidas adotadas pelo afilhado. Terminada a refeição, sairam para a rua, foram ao banco onde demoraram apenas alguns minutos.
Foram para a fazenda, onde Pedro Paulo e Maria Conceição estavam ansiosos pelo retorno do filho. Era a primeira ausência dele por mais dias e principalmente a uma distância tão grande. Rolaram abraços de todos os lados e depois ocorreu a entrega dos presentes trazidos. Os pais ficaram satisfeitíssimos com o que receberam. Uma cuia de chimarrão logo estava rodando, pois era algo que não podia faltar na casa de um gaucho que se preze. Quiseram saber das novidades vistas na capital. Maria Conceição quis saber das mulheres que encontrara. Tinha visto alguma que lhe causara impressão?
Pensou consigo, como é que a mãe fora logo perguntar isso? Parecia ter adivinhado o que aconteceu. Ficou alguns instantes pensativo e resolveu contar tudo, sem omitir detalhes. Terminou de sorver o chimarrão que estava em suas mãos, pigarreou e falou:
– P’ra le falar a verdade, mãe! Acho que encontrei a mulher da minha vida. Ela é filha de um general. Bem dizer o comandante da região militar da capital.
– Oigalê! Foi logo num galho bem alto buscar a fruta de seu gosto, – falou Joaquim.
– Que mal le pergunte, meu filho. Como foi você topar com essa moça? Filha de um general! Aí tem coisa! Trata de contá tudinho p’ra sua mãe.
– Tem nada demais não, minha mãe. Estava eu caminhando pela rua, decidido a ir marcar minha passagem de volta para a sexta-feira. Tinha acabado de concluir as questões dos investimentos, restando nada mais a fazer.
– Enrola não! Conta logo como foi. Stou morrendo de curiosidade, filho.
– Tinha um edifício muito bonito na esquina, ocupando quase meia quadra. No que olho para cima p’ra ver os ultimos andares, dei com o olhar numa sacada do quinto andar. Parecia uma deusa. Um rosto de anjo, cabelo louro e comprido, brilhando com o sol.
– Flechada certeira do Cupido, – disse Joaquim.
Pedro Paulo ouvia atentamente, lembrando da juventude quando dera com os olhos em Maria Conceição. O coração pulara igual potro xucro no peito. Voltou momentaneamente no tempo e reviu a prenda que lhe atingira o coração com um lance certeiro de boleadeira. Ficara para sempre preso e não se arrependia. Era uma prisão agradável e prazeirosa.
– Acho que foi esse tal de Cupido mesmo padrinho. Senti como uma pontada no peito. Contei os andares, fui entrando pela porta do edifício e subi direto, sem perguntar nada, nem dar satisfação a ninguém. Cheguei na porta do apartamento 501 e apertei a campainha com vontade.
– Assim, sem nunca ter visto a moça, nem pain em mãe? Vocé é mesmo maluco, meu filho. E se eles botassem você para correr?
– Eu pedia desculpas e saia. Não podia é perder aquela oportunidade. A senhora sabe que sou resolvido. Perco tempo não com rodeios. Vou direto ao ponto.
– E como le receberam? – indagou por sua vez Pedro Paulo.
– Quem abriu uma fresta da porta foi o próprio general. Me apresentei e logo le pedi a mão da filha em namoro. Ele inventou uma porção de desculpas para desviar do assunto, mas não dei chance. P’ra tudo que ele dizia eu tinha resposta. Por fim disse que a filha era meia manca.
– Manca? De mentira na certa.
– Ela tem um pequeno problema na perna esquerda. É de nascença, mas quase não se percebe. Eu respondi que não queria pra carrera e sim p’ra mode tirar umas crias.
– Te esconjuro! Dizer uma coisa dessa p’ro homem! Só mesmo tu meu filho.
– Acho que foi a conta e ele não ia ter o que me responder. Talvez mandasse dois capanga da portaria que tinham vindo acompanhar o desenrolar dos fatos me botar p’ra for a. Nisso a própria filha apareceu e perguntou o que acontecia. Aí ele falou p’ra ela que a conversa le dizia respeito. Ela sugeriu que eu entrasse e nós não ficasse ali na porta batendo língua, dando espetáculo p’ra curioso. Foi quando os dois gorila saiu de fininho e foi embora.
– Dentro de casa a conversa muda de figura. Já é um começo, – disse Joaquim.
            – Imagino o jeito do pai, um camarada bater na porta e falar uma porção de despautérios, querendo namorar a sua filha. Coitado do homem.
            – Coitado nada, mãe. Ele é um homem muito equilibrado, tem bom senso e humor também. P’ra mal dos pecados é torcedor do Grêmio. Fui obrigado assistir o jogo com o Nacional do Uruguai ontem de tarde
            – Se conseguiu o que queria, acho que ficou barato. Se a prenda é o que você falou no início e diante do que fez a seguir, poderia ter resultado em algo bem pior.
            – E eu não sei padrinho! Podia ter ido parar atrás das grades por uns dias. Não podemos esquecer que stamos sob o regime militar. É eles que mandam no país. Mas sou bagre ensaboado, liso e escorregadio.
            – Isso significa que agora vai visitar a namorada cada volta e meia. Sua vida vai ser mais tempo em viagem que em casa.
            – Ainda não mãe. Combinamos de eu preparar tudo para a família fazer uma visita aqui na fazenda.
            – Marcaram a data dessa visita?
            – Eu vou ligar e avisar. Eles vem de automóvel. O general está louco por experimentar o carro novo que comprou numa viagem. Até hoje só andou na cidade, uma ou outra viagem curtinha. Ainda tá com cheiro de fábrica.
            – Eles podem ficar hospedados na casa grande. Tem muito lugar lá sem ser utilizado. Podem ficar o tempo que quiserem.
            – Não falamos no tempo que vão ficar, mas creio que não vai ser coisa de um ou dois dias. Uma viagem assim, deve de ser aproveitada para valer à pena.
– Você é o administrador da propriedade. Tome as providencias necessárias e convida seus quase sogros, sua prenda a virem na hora que quiser. Deixo isso por tua conta.
– Me dá ao menos uns dias para dar um jeito na casa. Sempre fazemos limpeza, mas os quarto fechado e tudo, sempre junta poeira. Precise de uma faxina geral para ficar em condições de receber visita.
– Acho até que uma troca dos forros de cama, umas cortinas novas não fazia mal, não acha comadre? – falou Joaquim.
– Eu tinha pensado em tirar as cortinas, lavar tudo. Uma faxina geral nas janelas. Tirar todos os móveis do lugar, tirar as teias de aranha.
– Fique à vontade. Se for preciso eu passo uns dias na cidade. Venho só passear. P’ra isso que tenho o herdeiro que toma conta de tudo.
– Não tem problema, padrinho. Eu cuido de tudo e, caso seja preciso, dou um pulo lá e a gente conversa. O telefone também ajuda.
– Quem diria! Mandei ele p’ra capital a negócios e ele arranjou um “negócio” bem mais importante. Que le parece compadre Pedro? Esse seu filho saiu melhor que a encomenda. Eu ensinei ele a administrar a fazenda, mas isso não fazia parte das lições.
– Coisa que nasce sabendo, compadre Joaquim. Coisa do coração. Inda agora lembrei de quando botei os olhos em Maria Conceição. Fiquei sem chão. A cabeça meia zonza. Nem sei o que falei logo em seguida. Deve de ter sido uma bobagem não muito grande, poise ela acreditou e está aqui comigo tantos ano.
– É coisa do coração mesmo. Nessa hora o juizo sai de casa. Despois vorta mas já é tarde. Hahahahaha!
– Tá rependida, Ceição? – diz Pedro Paulo.
– Ia diantá o que? O jeito é guentá a mão.
– Eu bem que conheço vocês dois! Ficam se atazanando, mas não se largam de jeito nenhum.
– Vamo mudá o rumo dessa prosa. Compadre deve de ter o que mostrare a você filho. Teve umas mudança nos empregados nessa semana.
– Padrinho já me falou. Mas é bom darmos uma volta pela roça e nos pastos para ver como está tudo. Assim tomo pé do que precisa ser feito nessa semana.
– Eu inda so o capataz geral e tenho tudo nos conformes.
– Sei como o senhor comanda tudo, pai. Sei que se pode deixar a propriedade nas suas mãos e ficar despreocupado.
Sairam no jipe percorrendo as diversas áreas da fazenda. Em toda parte Gaudêncio era saudado, cumprimentava, prometia que teriam uma sessão para assistir aos filmes que gravara dos jogos de Internacional x Flamengo e depois Grêmio x Nacional do Uruguai. Tinha os principais lances registrados e num domingo a tarde os projetaria para todos verem. Teria o que mostrare tanto aos colorados como aos gremistas.
Encontraram tudo na mais perfeita ordem. Todos os procedimentos dentro das previsões para não perder prazos das diversas tarefas. Retornaram à sede e Pedro Paulo se dirigiu à sua moradia. As acomodações estavam em ordem. Joaquim e Gaudêncio tomaram banho e depois de tomarem um mate e conversar, contando, depois recontando os detalhes de tudo que houvera durante a semana. Na fazenda houvera necessidade de demitir um peão por ter provocado uma briga desnecessária. No momento que encontrassem um substituto seria preciso contratá-lo, pois não dispunham de reservas. Havia gente sendo sobrecarregada com a situação momentânea.
Nos dias subsequentes Maria Conceição encarregou duas mulheres, casadas com peões de realizar a limpeza em regra na casa grande. Enquanto isso foi com Gaudêncio até São Borja. Compraram um sortimento de forros de cama, panos para fazer cortinas novas, toalhas para os banheiros. Não havia necessidade de preocupação com os gastos. O patrão dera carta branca ao afilhado e ele queria tudo ao gosto. Era importante causar boa impressão aos pais e especialmente à filha, seu objetivo essencial.
Quando tudo ficou pronto, tudo limpo e as cortinas novas colocadas, Gaudêncio decidiu ligar para a capital com o objetivo de participar que tudo estava preparado para receber as visitas.
            Enquanto o telefone tocava, morria de ansiedade, torcendo para que fosse Ângela a atender. Logo ouviu uma voz de homem, dizendo:
            – Alô! Boa noite.
            – Boa noite, general. Aqui é o Gaudêncio. Estou ligando para informar que podem vir. Está tudo pronto. Meus pais e o padrinho estão ansiosos por conhecer ao senhor e sua família. Podemos aguardar vossa chegada para o final de semana?
            – Em princípio estaremos aí no sábado à tarde. Se ocorrer alguma mudança de plano ou algum imprevisto de última hora, eu ligo para avisar. Deixe-me só anotar o número do telefone daí.
            – Eu deixei o número junto com o endereço. Ficou com sua esposa, dona Lourdes. Mas não há problema. Se quiser anotar novamentes. – Gaudêncio repetiu o número do telefone, anotado do outro lado pelo general. – Quero aproveitar para deixar meus cumprimentos para dona Lourdes e para sua filha Ângela.
– Pode deixar que eu transmito. Transmita aos seus pais e ao seu padrinho os nossos cumprimentos. Nos veremos no sábado. Boa noite!
– Boa noite, general.
            No sábado à tarde, Gaudêncio, ao volante de uma das caminhonetes da fazenda, aguardava no trevo de entrada, a chegada dos visitantes, para lhes servir de guia até a fazenda. Não precisou esperar muito e viu apontar o Opala branco que pertencia ao general. Sinalizou para que o seguissem e saiu de seu posto de espera, tomando logo à frente o caminho secundário que conduzia à fazenda. Em pouco mais de meia hora estavam estacionando em frente à casa da vasta propriedade.
Ao desembarcarem, foram saudados por Joaquim e logo pelos pais de Gaudêncio. Este fez as apresentações, uma vez que era o único que conhecida a todos. Cumpridas as saudações preliminares, falou: 
            – Gaudêncio, vamos tratar de instalar os visitantes em seus aposentos. Enquanto isso vou ordenar aos criados que levem as bagagens para dentro.
Com um gesto deu ordens a dois empregados que estavam nas proximidades e logo se aproximaram, para transportar as bagagens ao interior da casa. Os visitantes estavam conhecendo suas acomodações. Não eram tão luxuosas quanto as de sua moradia na capital, mas ganhavam em espaço e conforto. Eram dotadas de abundante luminosidade e arejadas. Seria um imenso prazer passar alguns dias ali, respirando o ar puro do campo, rescendendo a flores silvestres, capim verde, frutas frescas que poderiam ser colhidas diretamente da fonte. Beber leite diretamente da fonte onde é produzido, sem aditivos químicos, nem processos industriais.
Mal tiveram tempo de tomar banho, vestir uma roupa leve, pois o clima estava quente e já estavam sendo chamados para sentarem-se à mesa na ampla varanda da casa senhorial. Estava servido um apetitoso lanche constituído de café recém coado, leite quente, queijo, mel, refresco de limão, pão caseiro, dois tipos de bolo e linguiça. Na verdade poderia ser considerado um pequeno banquete. Era amplamente conhecida na região a prodigalidade de Joaquim com seus hóspedes, bem como o bom tratamento dispensado aos empregados.  
Na pressa de chegar , haviam parado em uma lanchonete num posto de gasolina e comido um sanduíche. Estavam pois como se diz: varados de fome. Foi com indisfarçável alegria que se aproximaram da mesa e fizeram jus aos quitutes que lhes eram oferecidos. Enquanto comiam, a conversa corria informal e dona Lourdes aproveitou para conversar animadamente com Maria Conceição. Precisava tentar obter alguma informação sobre a família, cujo filho estava interessado em ter sua filha por companheira. Pelo que pudera ver até ali, nada havia a depor contra, mas era muito cedo para qualquer julgamento. Seria necessário um tempo a mais para poder formar uma opinião plausível e orientar a filha nessa decisão. O pretendente esperava com certeza uma desicão ao final daqueles dias que iriam passar naquele lugar aprazível.
            À noite os esperava uma animada festa de trovadores, duplas, trios de gaita e violão, declamadores, danças típicas, competições de chula, além de outros folguedos típicos dos pampas gaúchos. O típico churrasco, assado no fogo de chão, servido por assadores vestidos à caráter, intercalado por diversas cuias de chimarrão que rodavam entre todos os presentes. Para encerrar a noite, organizou-se num amplo galpão, um fandango, onde todos eram considerados iguais e Gaudêncio aproveitou para demonstrar suas habilidades de dançarino, rodopiando alegremente com Ângela pelo chão de cimento alisado.
            Ficou alegre em constatar que sua eleita também era boa dançarina. Acompanhou com desenvoltura as evoluções que ele fazia ao compasso das diversas danças típicas. Vestira uma roupa apropriada, comprada especialmente para a viagem, uma vez que não dispunha desse vestuário em seu guarda-roupa habitualmente. A vinda para Porto Alegre, depois de muitos anos no nordeste, havia ocorrido há tempo relativamente curto. O general escolhera para encerrar sua carreira no exército na terra natal e lhe foi oferecido o comando da região de Porto Alegre.  
Estação Ferroviária de São Borja em 1996.

 

Outra vista da estação em São Borja.

 

Acesso à fronteira.

 

Estrada para fronteira.
Igreja São Francisco em São Borja.
 
         O domingo foi usado em longos passeios pelos setores mais próximos da casa, bem como uma visita à sede do município. Onde visitaram os locais mais pitorescos, os pontos históricos e as instalações militares. Visitaram o túmulo de Getúlio Vargas e de João Goulart. Eram os filhos mais ilustres da região. Ambos tinham ocupado o posto supremo da nação em momentos diferentes. Uma excursão ao território argentine ficou para outro dia.
O general não deixou de fazer uma visita à unidade do exército instalada na fronteira. Não iria chegar de surpresa e por isso usou do telefone da casa de Joaquim para avisar ao Coronel comandante de sua presença na região e da intenção de fazer uma visita à unidade. Marcaram para a terça-feira a visita. Depois iriam ao território argentine para conhecer. O comando local se encarregou de comunicar às autoridades portenhas da presença do general e de sua ida ao outro lado da fronteira. A omissão de um comunicado poderia ser encarado como uma forma de pouco caso com as autoridades vizinhas.
Encontrou o quartel muito bem, nada havendo para apontar como descuido, desleixo ou pouco caso. Evidentemente havia sido feito um esforço para não deixar nada for a do lugar. Nem era uma visita oficial e portanto estava apenas cuprindo uma norma de cortesia. Ao se dirigir ao lado argentine, foram acompanhados até a divisa por duas viaturas com soldados a guisa de escolta. Depois de ultrapassaram a fronteira, seguiram sozinhos e aos cuidados dos militares vizinhos. Percorreram a distância até a cidade próxima.
Ponte sobre Uruguai.

 

Posto aduaneiro na fronteira.

 

Outra vista da ponte.
 
 
Passearam, fizeram algumas compras, sempre acompanhados de Gaudêncio e Joaquim. Haviam almoçado no quartel por insistência do comandante que mandara preparar uma refeição especial para o general e seus acompanhantes. Ao entardecer retornaram à fazenda, chegando com a noite fechada. A andança do dia, deixara todos cansados. Optaram por uma refeição leve e foram para cama cedo.

Avião trazendo corpo de Jango.
Povo assistindo guarda fúnebre.



No resto da semana, percorreram um a um os diversos setores da fazenda. As invernadas de engorda, recria, plantações de arroz, bem como as vacas de produção leiteira. Havia também, em escala menor, as hortaliças para abastecer os trabalhadores da fazenda; o pomar com suas macieiras, pereiras, laranjeiras fornecia a maior parte do suprimento de frutas. Um parreiral plantado numa encosta pedregosa, produzia uvas de excelente qualidade usadas na produção de um vinho colonial de boa qualidade. Quando envelhecido por cinco ou seis anos, adquiria melhores características. O proprietário se orgulhava dessa característica, pois for a o responsável pela implantação.
            Em todos os momentos que suas obrigações lhe permitiam, Gaudêncio estava ao lado de Ângela. Apresentava a moça aos conhecidos, amigos e aos vizinhos com os quais tinha encontros devidos ao trabalho. Vinham buscar algum insumo que a fazenda lhes repassava, a preço mais vantajoso do que se fossem adquiri-los no mercado normal. Entre idas e vindas, trabalhos e negociações com fornecedores, rodadas de chimarrão, noites de trova e cantoria, a semana chegou ao final. Na segunda feira, após dois domingos convivendo com os moradores da fazenda, chegou a hora de retornarem para Porto Alegre. Na hora da despedida, Gaudêncio aproximou-se de Ângela e perguntou:
– Então, você chegou a uma conclusão? Decidiu aceitar ser minha namorada?
            Aparentando alguma surpresa, Ângela disse:
– Acho que posso lhe dar uma chance. Se não der certo, não se perde nada além de algum tempo.
            – Posso anunciar a meus pais e também aos seus, que a partir de hoje nós somos namorados? – falou elevando tom de voz, para que todos ouvissem.
            – É isso mesmo, minha filha? – perguntou o General.
            – É sim papai. Vou dar-nos uma chance. Além disso estou gostando da idéia de viver numa fazenda. É muito bom o ar que se respira, o espaço que nos cerca, a liberdade de movimento e o canto dos pássaros, o cheiro de terra.
            – Fico satisfeito e dou meu apoio.
            – Nós o receberemos em nossa casa como a um filho, – disse dona Lourdes.
            – Serão sempre bem-vindos aqui, – disse Joaquim. – Fico satisfeito em ver meu afilhado escolhendo uma moça de boa família para companheira.
            – Para mim ela será como uma filha, – disse Maria Conceição, estendendo a mão e abraçando a que agora era a namorada do filho.
            Mãos foram estendidas, adeuses pronunciados e desejos de boa viagem extgermados pelos que permaneciam ali. Logo a família embarcou no carro e se dirigiu para a estrada. Quem não cabia em si de contentamento era Gaudêncio. Atingira seu objetivo. Era agora o namorado da filha do general Marcelino Ferreira. Tinha a sensação de ter conquistado um valioso troféu. Mas teria ainda muitas idas e vindas pela frente, até conduzir sua amada aos pés do altar. Diante do padre prometer fidelidade, amor e respeito para a vida toda.
            – Meu filho! Você encontrou uma pérola preciosa, – falou Maria Alice. – É um amor de pessoa. Mesmo sendo filha de um oficial de alta posição, é simples, educada e sabe até cuidade de uma casa. Espero que se entendam e depois encham a casa de netos.
            – Sua mãe falou tudo meu filho. Parabéns pela escolha. Não podia encontra melhor partido.
            – Só sobrou a mim emendar o que seus pais disseram, meu afilhado. Vou considerer a moça como minha nora. Acho que vai ser a primeira mulher a ter dois sogros de um único casamento.
            – Obrigado padrinho. Pai, mãe! Fico satisfeito que aprovem minha escolha. Vamos precisar de algum tempo para nos conhecer melhor, mas me parece que começamos bem.
            – Convém se matricular em um curso para melhorar sua instrução. Até mesmo fazer uma faculdade mais tarde.
            – Vou pensar nisso, padrinho. Acho que meus fundilhos não vão estranhar muito a diferença entre uma sela e um banco escolar.
            – Se estranharem, trate de acostuma-los. Seu futuro vale um pequeno sacrifício. Sem contar que no futuro vai ser útil na administração dos negócios da fazenda.
            – Ouça as palavras de seu padrinho, meu filho. Ele sabe o que está falando. Bem que poderia ter estudado antes. Oportunidade não faltou, mas você foi teimoso. Preferia montar a cavalo, ir para as lavouras de arroz.
            – Não vamos lamentar o que passou. Ele aprendeu muita coisa importante que hoje aplica no trabalho. O que falta pode ser aprendido com um pouco de esforço e tempo.

            – Vou me esforçar dobrado, pode deixar. Agora tenho um motivo a mais para me empurrar para frente.

Gaúcho típico com sua neta.
Vista dos campos do Rio Grande do Sul.

 

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